O sonho do dia do Brasil ! Pedido de um filho ao pai no Japão!

Estes dias encontrei um amigo compartilhando um anúncio sobre o dia do meu país: Dia do Brasil. Confesso que não sei se existe este dia no Brasil, já faz tempo que esqueci os estudos, escrevo com certa dificuldade. Sei ler, mas interpretar muitas coisas ainda me é difícil; tem de estar bem certinho as palavras e não pode trazer pensamentos ou opniões embutidas sobre o tema, tem que vir direto e objetivo. De outra forma acabo confundindo e pensando que qualquer texto queira me atacar até quando um amigo lê para mim. Triste ter que assumir isto, mas fazer o que? Pouco estudo, muitas horas de trabalho todos os dias desde quando cheguei ao Japão para ser mais um em busca de um sonho.

Trabalhei por mais de 18 anos aqui, juntei um pouco de dinheiro no começo, trouxe minha família depois de 4 anos; era para ficarmos mais 3 anos apenas, mas olha aí, estamos 11 anos a mais que o planejado.

Falar em dia do Brasil, me traz muitos boas lembranças, família reunida, família grande, irmão, tios, primos, até as tias chatas faladeiras, a sogra brava e implicante, meus pais – que Deus ainda os tenha com saúde! Qual a última vez que os vi? Lágrimas correm dos meus olhos para falar disto, tenho medo que Deus os leve e meus filhos não os abracem. Meus filhos perderam a emoção do que é ter avô, avó juntos, carinho de tios… Aqui, somos uma família, nossa célula de 4 pessoas.

Dia do Brasil, poxa!, que palavra bonita, será que tudo pode mudar neste dia? Trabalho como empregado de uma empresa de mão de obra terceirizada há 11 anos na mesma fábrica. Nunca faltei, sempre dei o melhor de mim, todos são meus amigos, aprendi a falar um japonês na marra e fiz amizades com meus chefes, mas ainda sou apenas mais um por lá.

Poderia contar minha história, iria ser apenas mais uma parecida com a de tantos compatriotas que são honestos, respeitam as leis, pagam seus impostos e recebem também algumas ajudas do governo porque é direito de todos. Enfim, sou apenas mais um brasileiro que vive no Japão, que veio atrás de um sonho até então não alcançado conforme o planejado inicialmente.

Dia do Brasil para mim é uma festa com pessoas alegres, pessoas que trabalham todos os dias e saem para se divertir numa comemoração com outros que não se conhecem, mas que falam a mesma língua, sabem a mesma cultura e, também, vivem os mesmos problemas.

Neste dia fico pensando nas autoridades que porventura possam estar presentes nesta festa, nas empresas que mostram seus serviços, comidas, as ONGs que lutam por muitas coisas, nossos representantes diplomáticos que estão lá vendo, assistindo, palestrando, agradecendo etc. etc.. Muito legal pensar nisto!

Por outro lado, quantos dias do Brasil que vemos por aí? Em muitos países, todos com o mesmo intuito, de ser um dia de comemorações.

Fui explicar isto ao meu filho e ele me falou: “pai, se o dia é do Brasil com o Presidente do Brasil vindo ao Japão, peça a ele para pedir para sua empresa contratar você como empregado e sair da empreiteira, quem sabe assim o senhor ganha mais e pode voltar rápido para a gente visitar a vovó, para que eu possa conhecer meus primos e saber como eles vivem no Brasil que eu nasci.”

Por estas palavras desta criança que nasceu e só viveu no Japão que resolvi escrever este texto.

Meus amigos e minhas amigas, para o meu filho, nossa Presidente irá vir porque é o dia do Brasil, é nosso dia e a figura maior do país virá nos cumprimentar, observa ele em seu imaginário. Vejam a inocência de uma criança. Todavia, com um pensamento que me assustei em saber que ele sabe que ganho menos que o pai de seu amigo de escola que trabalha na mesma empresa que eu. Mesmo sem eu e minha mulher conversarmos sobre isto para poupar as crianças de saberem coisas, a fim de não deixá-las preocupadas, se sentindo inferiores a seus amigos japoneses por nós sermos estrangeiros e não ter os mesmos direitos.

Dia do Brasil seria uma grande oportunidade para nossos representantes, os servidores públicos – que tem obrigação de servir ao público e não apenas interesses de seus chefes ou pessoas que se escoram nas instituições diplomáticas para tentar algum lucro, fama ou destaque público. Seria a oportunidade para estes nossos representantes exigirem do governo japonês, das empresas que podem estar nestas festas fazendo fichas, entrevistas, a prestarem mais assistência aos trabalhadores, a começar por arcar com os devidos direitos trabalhistas de forma ampla.

Não queria muito, queria apenas que nossos representantes diplomáticos pedissem isto, e as empresas que dão dinheiro para entrar nesta festa, que dão dinheiro para poder ter exclusividade em fazer fichas e entrevistas, por sua vez, que respeitassem nossos direitos. Que elas paguem os salários com honestidade, sem ter de descontar 200, 100 ou 50 ienes que seja, ao inscrever os empregados no Seguro Social (Shakai Hoken).

Isto deveria ser uma obrigação moral dos nossos representantes: exigir destas empresas que nos exploram (empreiteiras), mesmo as empresas contratantes pagando, honestidade e seriedade com o trabalhador brasileiro. De igual modo, seria pedir muito que as ONGs que promovem estas festas agissem dentro da lei, averiguando a idoneidade das empresas patrocinadoras?

Eu conversei sobre isto com minha mulher, quando estávamos sozinhos em casa, como já disse, sempre falamos disto longe dos filhos para não passar insegurança de pais que não sabem o dia de amanhã, apenas acreditamos que estará bem, que teremos serviços. Eu contei à minha mulher o pedido de meu filho, ela chorou ao saber que as crianças sabem de nossas vidas muito mais do que imaginávamos. Talvez por isto em muitos casos elas se calam, tentam mostrar forças para não nos decepcionar. Será que nossos filhos nos acham uns coitados que sempre lutaram e não podem ter o mesmo padrão de vida de seus amigos japoneses, mesmo trabalhando na mesma fábrica e fazendo o mesmo serviço dos pais destes? O que nossos filhos sabem de nós?

O que nossos representantes diplomáticos sabem, de fato, sobre nós que trabalhamos no chão de fábrica no Japão? O que nossos representantes pensam de nós que vivemos no Japão, que trabalhamos para manter ativa a economia do país, que trabalhamos para manter ativa todo o comércio que atende nossa comunidade brasileira? O que sabe de nossos filhos, os sonhos de conhecerem a família, a vontade de abraçar um primo? O que realmente sabem de nós? Ou será preciso que o Congresso Americano ou o Departamento de Estado dos EUA elabore um documento apontando a situação trabalhista dos brasileiros no Japão? Ou, ainda, será preciso que o governo de Israel, caso tome conhecimento de como o Brasil lida com a situação dos seus no exterior, repita a celebre expressão: “Brasil, o anão diplomático!” e acrescente: “nem para seus próprios cidadãos no exterior é capaz de cobrar o devido respeito!”? Seria trágico, não? Bem que poderia acontecer de algum país apontar o dedo na cara da diplomacia brasileira neste particular…

Bem , todavia, eu acho que os representantes pensam que somos apenas peças de reposição nas fábricas japonesas, que somos analfabetos por não sabermos as leis, não sabermos ler um jornal diferente ou uma notícia fora destas revistas que só querem vender a imagem de que temos que ser mais pacientes, se não os asiáticos vão tomar nosso lugar. Tudo para fazermos nos calar, tudo para colocarmos no lugar que estamos como analfabetos e por isto não podermos pedir que nos respeitem.

Eu li a última matéria nesta página, me chamaram de analfabeto. Fiquei muito bravo, fiquei triste, faltou o respeito. Depois que meu amigo leu para mim e disse que a mensagem era para ser interpretada e não lida superficialmente, eu entendi. Foi triste assumir que ser analfabeto é isto, que em todos estes “Dia do Brasil”, “Brazilian Day” e outras festividades estilo “política pão e circo” que tivemos ninguém nunca levantou uma bandeira em prol de nós, os “analfabetos” que são honestos e trabalhadores, que são simples e não sabem se expressar.

Assumi que sou analfabeto no japonês (meu conhecimento de português é pouco até para escrever este texto), meu filho é quem lê muitas coisas para mim e para minha esposa, falamos o japonês mas não lemos tudo. Somos realmente analfabetos e sem ninguém para nos defender. Pessoas que poderiam nos ajudar em ter respeito, apenas respeito em nossos poucos direitos, simplesmente, procuram o caminho mais fácil para desviar a atenção.

Nestes 18 anos de serviço, se tivesse ao menos o direito a folgas, a bônus da metade dos japoneses, não precisaria de meu filho, em sua inocência, querer que a Presidente do meu país pedisse a empresa em que trabalho mais respeito por mim, trabalhador.

Estou escrevendo da minha maneira, peço que as pessoas da página corrijam se possível e me enviem antes de publicar, não quero que apareça comercial ou algo que não disse, para ninguém ganhar fama com meu pedido. Espero um dia, que seja logo, poder ter o devido respeito das empresas japonesas, principalmente das que têm lucrado muito por meio da negação dos direitos trabalhistas, mas antes, gostaria de ter a devida atenção dos servidores públicos brasileiros e das ONGs que fazem tudo isso e que recebem ajuda alegando ajudar a comunidade.

Os artistas e cantores que vem de fora sabem realmente como nós, os trabalhadores, que fazemos deste dia o motivo deles ganharem seus cachês pelo mérito de seus talentos, sabem como somos explorados em não termos os direitos respeitados, e ninguém se empenha na nossa causa?

Você, meu amigo, minha amiga, que vai para a festa do “Pão e Circo”, veja se alguém exigiu algo das empresas para poder oferecer empregos. Veja se as empresas tem contratos justos; elas estão debaixo do nariz dos nossos representantes; não podem fazer diferente do que a lei determima.
Mas, afinal, que Dia do Brasil é este, então? “Pão e Circo” para todos, ou conscientização em sermos RESPEITADOS como cidadãos que possuem visto, que pagam seus impostos e têm responsabilidades com o serviço e a empresa que nos contrata?

Para nossos representantes, digo que gostaria de poder dormir como vocês, tendo direito no salário, na estabilidade de emprego, direito em poder faltar justificadamente e não ter o dia descontado, ter o direito a receber verba indenizatória, uma ajuda de transporte e pelo menos não pagar o dobro do preço do uniforme que uso para trabalhar – sim, meus amigos, até meu uniforme custa o dobro do preço porque sou de empreiteira; meu amigo japonês que compra para mim e eu pago a ele.

Gostaria principalmente que meu filho não precisasse me pedir para nossa Presidente pedir respeito por mim.

Conclusão:
O autor do presente texto, nosso leitor, que antes de entender nossa matéria sobre visto para Yonsei estava muito bravo e agora que entendeu nossa mensagem nos presenteia com este texto, que serve de pedido as ONGs e aos servidores públicos brasileiros no Japão, para que levem a bandeira da dignidade e façam ser respeitados os direitos que todos deveriam ter, os poucos direitos que a lei japonesa ainda garante.

Dia do Brasil, uma oportunidade única para todos exigirem mudanças, discutir problemas e não apenas dividir “Pão e Circo” para que tudo seja colocado debaixo da mesa, camuflado, relativizado.

Olhando de uma maneira singular, os brasileiros no Japão, pela apuração dos votos da última eleição, tiveram o mesmo comportamento político, o mesmo direcionamento de ideias em relação a fazer um novo governo no Brasil. Sendo assim, usem esta mesma união para exigir, para unir pessoas em prol de uma causa: o pleno respeito aos direitos trabalhista.

Qual o melhor momento para isto? Depois de uma festa? Antes de uma festa? Deveria ser durante uma festa que reúne pessoas com os mesmos problemas. Comer e dançar? Dançamos todos os dias, rebolamos todos os dias no nosso trabalho, nos nossos compromissos, tudo isto para podermos comer. Fazer de um dia de união de pessoas um marco para iniciar uma luta de mudanças com o respaldo de nossos representantes públicos do governo brasileiro não seria uma utopia, seria apenas um ato corajoso, um ato de querer mudar e melhorar um pouco a vida sofrida de muitos nipo-brasileiros nestes anos de exploração.

Sobre nosso último texto, não faltamos com o respeito, apenas usamos as mesmas palavras que todos estes, empreiteiras e empresas que exploram nossa comunidade usam; eles consideram os brasileiros analfabetos por não conseguirem ir além do que lhes são empurrados boca a baixo.

Temos que dar um basta e podemos começar pela grande reunião de pessoas, tudo com responsabilidade e sabedoria. O que se espera neste dia de movimento? Lucro na venda de produtos e serviços, lucro em ter um apanhado de contatos, lucro em promover uma festa de “Pão e Circo”.

Dizer a estes trabalhadores que eles têm de tirar a “bunda do sofá” e fazer algo, seria fazer o quê? Estudarem o idioma japonês para cada um conseguir sozinho suas oportunidades? O que mais eles poderiam fazer? Se esforçarem sozinhos e conseguir cada um o melhor, ou seria o correto ter também nossos representantes e ONGs brigando em prol de todos, exigindo apenas a mesma equidade da lei para todos nós?

Quando dizemos que as pessoas não se esforçam, queremos dizer que devam lutar sozinhas e serem vencedoras sozinhas, mesmo pagando os mesmos impostos que todos? Qual seria a melhor opção e a melhor via para alcançarmos algo? Alguém se arrisca a oferecer alguma sugestão?

Nós ainda pensamos que os representantes do governo podem juntar esta demanda e lutar em prol de todos, mostrando serviço à comunidade. Sim, mostrando serviço neste sentido, porque o que mais vemos são fotos em comemorações com meia-dúzia de empresários, os chamados “amigos do rei”, que lucram com a comunidade. Não acreditam? É só ver as fotos das confraternizações, jantares e palestras, onde estes poucos empresários fazem questão de mostrar as “autoridades” nas redes sociais, com a clara e evidente intenção de mostrar influência, respeito, demarcar território entre o alto escalão (eles) e o baixo escalão (trabalhadores), ou por mera caipirice, desconhecendo o fato de que as “autoridades” bajuladas por eles são servidores, e não autoridades. Vale ressaltar que, na verdade, são servidores PÚBLICOS, mas que, ironicamente, parecem estar servindo somente aos interesses particulares, servindo de “garotos propaganda” para certos empresários da comunidade. E ainda tem quem os defenda nos comentários de nossas matérias, “como autoridades que lutam pela comunidade no Japão!”. Que comunidade? Comunidade de meia-dúzia de empresários brasileiros e outros tantos japoneses?

Pedir respeito é fazer diferença, respeito e pedidos com responsabilidades.

By Connexion.tokyo Team

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