“Vim para o Japão por conta própria, para não precisar entrar na ciranda da exploração feita por empreiteiras que superfaturam passagens e cobram taxas de alocação.
Cheguei aqui com o pensamento de que, antes de mais nada, deveria juntar no mínimo o suficiente para pagar minha passagem de volta, caso não desse certo ou tivesse algum empecilho.
Fui além disso, sempre trabalhei a fim de poupar, e quantias suficientes, para não levar desaforo para casa, para poder repreender chefes e líderes folgados se preciso for.
Desse modo, vim para o Japão para trabalhar e construir algo para minha família, não para ficar aturando encheção de saco de “filho de uma égua” nenhum, seja japonês, brasileiro ou qualquer outra nacionalidade!
Durante o tempo em que estou aqui neste país, já tive alguns desentendimentos. Mas em todos mantive-me fiel aos meus princípios: prezar por minha dignidade e não levar desaforo para casa; não ficar estressado por conta de tentativas de humilhação vindas por parte de ninguém, sobretudo de japoneses; resolver no ato.
Pois bem. Ontem, dia 02 de março, quando estava indo embora para casa, vi um líder da empreiteira, japonês, abordando alguns estagiários filipinos de forma muito bruta, tanto em palavras como em gestos, para que eles o acompanhassem.
Aproximei-me do grupo e perguntei o que estava acontecendo, pelo que o japonês me respondeu: “a conversa é com eles.”
Ok. Continuei observando.
Um outro estagiário se aproximou do pessoal e perguntou se ele também teria de acompanhar. O ignorante japonês gritou: “você não, idiota, só eles! Você, é amanhã!”
Continuei caminhando e observando; a princípio estávamos indo na mesma direção, eu rumo ao portão de saída e o grupo indo rumo ao local onde teriam uma conversa.
O japonês continuou xingando os filipinos. Eu perguntei novamente o que estava acontecendo. Esse líder disse que eu também teria de ir amanhã conversar.
“Onde? Conversar sobre o quê?”, perguntei.
Ignorantemente, e para a infelicidade dele, ele me disse, com aquele jeito japonês irritante de falar quando se está nervoso: “amanhã, amanhã, amanhã… vá embora, rápido, vá embora, rápido, seu idiota, irritante…”, pressionando-me com a mão para que eu fosse embora.
Não deu outra. Quando ele invadiu meu espaço físico, tocando em mim com a mão e dizendo tais palavra, dei-lhe um tapão na mão, com a qual segurava alguns documentos.
Os documentos caíram espalhados pelo chão, ele correu para catá-los e eu comecei a gritar com ele, e gritei muito. Disse em bom e alto tom que nem eu e nem os filipinos éramos gados, animais para serem escorraçados daquele maneira.
Ele ainda deu algumas resmungadas, mas foram abafadas pelos meus gritos dirigidos a ele. Os filipinos ficaram atônitos olhando.
Chegando em casa, telefonei para o superior desse líder e expliquei por alto o que havia ocorrido, e disse que no outro dia (hoje) queria conversar com ele e com o japonês folgado.
Hoje pela manhã, ao chegar na empresa, fui saudado por alguns filipinos que estavam presentes no incidente no dia anterior; cumprimentaram-me apertando minha mão e me chamando de “amigo”.
Em seguida, o superior da empreiteira me chamou para irmos conversar. O japonês tentou se justificar, dando explicações sobre o porquê de ter ficado nervoso no dia anterior.
Eu disse a ele: “continue assim então. Você já tem 45 anos, não é casado, não tem namorada, e isto é indício que você é uma pessoa difícil de se relacionar. Você precisa se tratar.”
E ainda: “Você, apesar de líder na empreiteira, tem uma forma de abordar as pessoas bastante ultrapassada. Você não passa de um líder medíocre, um cão de guarda para os seus superiores” — disse olhando para o superior dele que estava presente.
E mais: “para cima de mim, não! O tratamento será recíproco e progressivo: gritou, receberá grito mais alto; tocou, tomara tapão como o que te dei na mão ontem. Ok?
Estamos combinados?”
E como se não bastasse, entreguei uma nota, em inglês, que redigi contra o assédio moral ao superior desse japonês, na frente dele, dizendo que encaminharia ela aos filipinos para que eles entregassem aos chefes da firma contratante, caso continuem sofrendo humilhações.
E disse ainda que se repetisse cenas como a que aconteceu ontem, enviaria por e-mail à empresa contratante e à empreiteira, e a quem mais necessário fosse.
Pela conversa que o superior da empreiteira teve comigo em seguida, percebi que ele levou muito a sério o que me propus a fazer.
E é bom mesmo que ele tenha levado a sério, pois farei, caso se repita.
Inclusive, a empresa contratante, nas reuniões mensais de segurança, aborda as questões ‘assédio moral e sexual’.
Entretanto, casos como o de ontem acontecem às margens do conhecimento da empresa, geralmente, só em cima dos estagiários filipinos.
Porém, desta vez, para o azar do japonês irritado, essa palhaçada ocorreu no horário errado e contra a pessoa errada — não que seja correto ocorrer com quem quer que seja.
No mais, tanto a empresa em si, quanto a empreiteira como um todo, não são lugares ruins de trabalhar, excluindo-se elementos como o supracitado “líder medíocre” e um outro japonês igualmente folgado.
De todo modo, foi bom ter ocorrido. Assim, já deixei avisado o que farei caso isto se repita.” — S. S., Aichi.
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